terça-feira, 24 de dezembro de 2013

O Comando de sí

"As palavras do Zaratustra de Nietzsche são atuais e pertinentes, quando ele pergunta que busca se livrar de todo grilhão: 

"Você chama a si mesmo de livre, mas isso não me interessa - Eu te pergunto: livre para quê?"

Lembrando que há casos em que o único valor que se possui são lançados longe junto com o grilhão. Esse é o claro alerta para aqueles hoje que só sabem falar de "repressões" e que se alimentam de uma intolerância histérica por todo tipo de autoridade - e eles alimentam tal intolerância - só por essa razão: porque eles não possuem em si mesmos um princípio superior que comanda. " (dar a sí mesmo uma lei de si mesmo)

-Evola


"O mundo é livre: fins e razões, evolução, destino e providência, tudo isso é neblina, é uma coisa inventada por seres que não sabiam ainda caminhar por si mesmos e precisavam de andadores e de pontos de apoio. Agora, serás deixado a ti mesmo. E deves chegar a sentir-se um centro de forças, até conhecer a ação que não se determina mais por este ou por aquele objeto, senão por si mesma." 

-Resulta do desapego, e produz retorno ao instinto antes incompreendido, e ação livres: não será mais movido, mas sim moverá .

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Abstração e potencia

"A maioria dos seres humanos passa o tempo ganhando a vida, se ocupando de sua família ou resolvendo problemas. Não tem ocasião para se abstrair em simples contemplação abstrata. E enquanto tanto, na simples contemplação abstrata está contida uma força colossal. As pessoas capazes de se entregar a semelhante contemplação e que a praticam, reúnem tal energia, tal autoridade e peso de personalidade, que praticamente exercem uma influência mágica sobre aqueles que se aproximam. As pessoas capazes simplesmente de meditar sem entrar em transe, quer dizer de contemplar de maneira ativa, se convertendo no espelho de todo o ser, os que possuem essa capacidade de maneira inata, são muito poucas, porém existiram sempre entre todos os povos e em todas as épocas da humanidade. E precisamente são eles os eleitos como os intermediários entre o princípio escuro sobrenatural que tenta ao homem, e os homens como tecido social. A sociedade não é mais que um simples mecanismo, em que se encarna o poder que se esconde por trás da contemplação, ou o poder da tentação, expandido por este espaço cinzento entre o céu e a terra." 

- Geidar Dzhemal

domingo, 15 de dezembro de 2013

Revolução da Alma

"Ninguém é dono da sua felicidade, por isso não entregue a sua alegria, a sua paz, a sua vida, nas mãos de ninguém, absolutamente ninguém. Somos livres, não pertencemos a ninguém e não podemos querer ser donos dos desejos, da vontade ou dos sonhos de quem quer que seja.
A razão da sua vida é você mesmo. A sua paz interior é a sua meta de vida… Quando sentir um vazio na alma, quando acreditar que ainda está faltando algo, mesmo tendo tudo, remeta o seu pensamento para os seus desejos mais íntimos e busque a divindade que existe em si. Pare de colocar a sua felicidade cada dia mais distante de você.
Não coloque o objetivo longe demais de suas mãos, abrace os que estão ao seu alcance hoje. Se andar desesperado por problemas financeiros, amorosos, ou de atribulados relacionamentos familiares, busque no seu interior a resposta para se acalmar. Você é o reflexo do que pensa diariamente. Deixe de pensar mal de si mesmo e seja o seu melhor amigo sempre…
Sorrir significa aprovar, aceitar, felicitar. Então, ponha um sorriso, para aprovar o mundo que lhe quer oferecer o melhor…
Com um sorriso no rosto as pessoas terão a melhor das impressões de si, e você estará afirmando a si mesmo que está pronto para ser feliz.
Trabalhe, trabalhe muito a seu favor. Pare de esperar a felicidade sem esforços. Pare de exigir das pessoas aquilo que nem você conquistou ainda.
Critique menos, trabalhe mais. E não se esqueça, nunca, de agradecer.
Agradeça tudo o que faz parte da sua vida neste momento. A nossa compreensão do universo, ainda é muito pequena para julgar o que quer que seja na nossa vida.
A grandeza não consiste em receber honras, mas em merecê-las…"


Aristóteles, filósofo grego, escreveu esta "Revolução da Alma“ no ano 360 a.C.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Delirios e visões

No início de 1944 fraturei um pé e logo depois tive um enfarte cardíaco. Durante a inconsciência tive delírios e visões que provavelmente começaram quando, em perigo de morte, administraram-me oxigênio e cânfora. As imagens eram tão violentas que eu próprio concluí que estava prestes a morrer. Disse-me minha enfermeira mais tarde: “O senhor estava como que envolvido por um halo luminoso”.
... Parecia-me estar muito alto no espaço cósmico. Muito ao longe, abaixo de mim, eu via o globo terrestre banhado por uma maravilhosa luz azul. Via também o mar de um azul intenso e os continentes. Justamente sob os meus pes estava o Ceilão e na minha frente estendia-se o subcontinente indiano. Meu campo visual não abarcava toda a Terra, mas sua forma esférica era nitidamente perceptível e seus contornos brilhavam como prata através da maravilhosa luz azul. Em certas regiões, a esfera terrestre parecia colorida ou marchetada de um verde escuro como prata oxidada. Bem longe, à esquerda, uma larga extensão – o deserto vermelho alaranjado da Arábia. Era como se ali a prata tivesse tomado uma tonalidade alaranjada. Adiante o mar Vermelho e mais além, como no ângulo superior esquerdo de um mapa, pude ainda perceber uma nesga do Mediterrâneo.Meu olhar voltara-se sobretudo para essa direção, Ficando o restante impreciso. Evidentemente via também os cumes nevados do Himalaia, mas cercados de brumas e nuvens. Não olhava “à direita”. Sabia que estava prestes a deixar a Terra.
Mais tarde informei-me de que distância dever-se-ia estar da Terra para abarcar tal amplidão: cerca de mil e quinhentos quilômetros! O espetáculo da Terra visto dessa altura foi a experiência mais feérica e maravilhosa da minha vida.
Após um momento de contemplação eu me voltei. Postara-me, por assim dizer, dando as costas ao octano índico com o rosto voltado para o norte. Parecia-me agora virar em direção ao sul. Algo de novo surgiu no meu campo visual. A uma pequena distância percebi no espaço um enorme bloco de pedra, escuro como um meteorito, quase do tamanho de minha casa, talvez um pouco maior. A pedra flutuava no espaço e eu também.
Vi pedras semelhantes nas costas do golfo de Bengala. São blocos de granito marrom escuro, nos quais às vezes se escavavam templos. Minha pedra era também um desses escuros e gigantescos blocos. Uma entrada dava acesso a um pequeno vestíbulo; à direita, sobre um banco de pedra estava sentado na posição de lótus, completamente distendido e repousado, um hindu de pele bronzeada vestido de branco. Esperava-me sem dizer uma palavra. Dois degraus conduziam a esse vestíbulo: no interior, à esquerda, abria-se o portal do templo. Vários nichos cheios de óleo de coco em que ardiam mechas cercavam a porta de unia coroa de pequenas chamas claras. Isso eu realmente vira em Kandy na ilha do Ceilão, quando visitava o templo do Dente Sagrado; inúmeras fileiras de lâmpadas a óleo cercavam a entrada dele.
Quando me aproximei dos degraus pelos quais se chegava ao rochedo, ocorreu-me algo estranho: tudo o que tinha sido até então se afastava de mim. Tudo o que eu acreditava, desejava ou pensava, toda a fantasmagoria da existência terrestre se desligava de mim ou me era arrancada – processo extremamente doloroso. Entretanto alguma coisa subsistia, porque me parecia então ter ao meu lado tudo o que vivera ou fizera, tudo o que se tinha desenrolado a minha volta. Poderia da mesma maneira dizer: estava perto de mim, e eu estava lá; tudo isso, de certa forma, me compunha.
Tive ainda uma outra preocupação: enquanto me aproximava do templo, estava certo de chegar a um lugar iluminado e de aí encontrar o grupo de seres humanos aos quais na realidade pertenço.
Então finalmente compreenderia – isso também era para mim uma certeza – em que relação histórica me alinhava, eu ou minha vida.
... Enquanto pensava nessas coisas, um fato atraiu minha atenção: de baixo da Europa, ergueu-se uma imagem: era meu médico, ou melhor sua imagem, circundada por uma corrente de oum ou por uma coroa de louros dourada. Pensei imediatamente: “Ora veja! é o médico que me assistiu! Mas agora aparece em sua forma primeira, como um Basileus de Cos1. Durante sua vida fora um avatar desse Basileus, a encarnação temporal da forma primeira, que existe desde sempre. Ei-lo agora em sua forma original”.
Sem dúvida eu também estava na minha forma primeira. Não cheguei a percebê-lo, somente imagino que deva ter sido assim. Quando ele chegou diante de mim, pairando como uma imagem nascida das profundezas, produziu-se entre nós uma silenciosa transmissão de pensamentos. Realmente meu médico fora delegado pela Terra para trazer-me uma mensagem: protestavam contra a minha partida. Não tinha o direito de deixar a lena e devia retomar. No momento em que percebi essa mensagem a visão desapareceu.
Decepcionei-me profundamente; tudo parecia ter sido em vão. O doloroso processo de “desfolhamento” tinha sido inútil: não me fora permitido entrar no templo, nem encontrar os homens entre os quais tinha o meu lugar.
Na realidade passaram-se ainda três semanas antes que me decidisse a viver; não podia alimentar-me, tinha aversão pelos alimentos. O espetáculo da cidade e das montanhas que via do meu leito de enfermo parecia uma cortina pintada com furos negros ou uma folha de jornal rasgada com fotografias que nada me diziam. Decepcionado, pensava: “Agora é preciso voltar ‘para dentro das caixinhas!”. Parecia, com efeito, que atrás do horizonte cósmico haviam construído artificialmente um mundo de três dimensões no qual cada ser humano ocupava uma caixinha. E de agora em diante deveria de novo convencer-me que viver nesse mundo tinha algum valor!
A vida e o mundo inteiro se me afiguravam uma prisão e era imensamente irritante pensar que encontraria tudo na mesma ordem. Apenas experimentara a alegria de estar despojado de tudo e eis que de novo me sentia – como todos os outros homem – preso por fios dentro de uma caixinha. Quando estava no espaço não tinha peso e nada podia me atrair. E agora, tudo terminado! Sentia resistência contra meu médico porque ele me reconduzira à vida. Por outro lado, inquietava-me por ele: “Por Deus, ele está ameaçado! Não me apareceu sob a forma primeira? Quando alguém chega a essa forma é que está para morrer e desde então pertence à sociedade de ‘seus verdadeiros semelhantes”. Repentinamente tive o terrível pensamento de que ele deveria morrer – no meu lugar! Procurei fazê-lo entender da melhor maneira, mas não me compreendeu. Então me aborreci. “Por que finge ignorar que é um Basileus de Cos e que já reencontrou a sua forma primeira? Quer me fazer acreditar que não sabe?”
Isso me irritava. Minha mulher reprovou a falta de amabilidade que eu demonstrava em relação a ele. Ela tinha razão, mas ele me contrariava, recusando-se a falar de tudo o que vivêramos em minha visão. “Deus meu, é preciso que ele preste atenção! Não pode ficar tão despreocupado assim. Gostaria de falar-lhe a fim deque tomasse cuidado consigo.” Era minha firme convicção de que ele estava em perigo porque eu o vira em sua forma original.
E, com efeito, fui seu último paciente. Em 4 de abril de 1944 – sei ainda exatamente a data – fui autorizado pela primeira vez a sentar-me à beira da cama e nesse mesmo dia ele se deitou para não mais levantar. Soube que tivera um acesso de febre. Pouco depois morreu de septicemia. Era um bom médico; tinha algo de gênio, senão não teria aparecido sob os traços do príncipe de Cos.


CG. Jung Memórias, Sonhos, Reflexões