É no esforço e no trabalho individuais, através de
atos instintivos e de vontade, num jogo de poder em todos os níveis e em
todas as áreas, numa luta de superação de obstáculos, que faz o homem
evoluir.
O homem comum, de massa, é dependente do seu grupo:
"Ele é em grande
parte, controlado pelas compulsões inconscientes dos instintos genéricos, pelas tradições coletivas e pelas emoções de massa... e como tal ele depende,
para sua energia e mais ainda para seus motivos e metas, de fatores
fundamentais dentro da vida da coletividade humana da qual constitui uma
expressão diferenciada." (Rudhyar.)
A sua vida está apoiada nos seus amigos,
na sua corporação, no seu grupo social, na nação com que se identifica. Ele
não é um in-divíduo, na verdadeira acepção do termo, ele é ovelha de um
rebanho. Na sua inconsciência acha que todos os homens são iguais. Os pontos
de apoio de sua personalidade são a fé cega e a segurança psicológica que o
grupo oferece.
"O homem massificado não tem valor; é uma simples partícula
que perdeu a sua alma, isto é, o sentido de sua humanidade", afirma C. G.
Jung.
O homem-massa é movido pelas paixões, amor e ódio, como magnificamente
Padre Antônio Vieira, sintetiza as paixões humanas. A sua consciência
é fragmentada, é um arquipélago, na citação de C. G. Jung, pois
identifica cada coisa individual e separadamente, sem perceber o conjunto
que, por sua vez, está inserido no todo. A sua percepção é dual e assume uma postura unilateral, determinada e dirigida. Num conceito amplo, ele está
mergulhado na confusão porque não compreende as coisas do mundo. Ele está com
uma verdade que se confunde com a verdade do seu grupo.
O homem comum
segue um guia, um líder, uma autoridade, um mestre, um guru, um salvador. A
sua religião exige vontade, disciplina, esforço e sacrifício para atingir a
redenção ou a "iluminação".
A energia da vontade, entretanto, é naturalmente
utilizada e direcionada pelo ego para o seu fortalecimento - querer é poder.
A vontade inquebrantável, a disciplina, o esforço e o sacrifício poderão
levar o ego à perfeição, mas não levarão o homem à iluminação, à Verdade, à
Deus. No
entanto, somente aquele que aperfeiçoou o ego pode perdê-lo e
assim, encontrar a sua verdade. Este não será um ato de vontade, mas
acontecerá, quando menos esperar, por força da Lei que move a Vida, o Universo. A
força da vontade passa agora para o domínio daquelas forças profundas,
naturais e involuntárias que governam a vida (Nietzsche). Neste processo há a assimilação da "sombra":
"A sombra representa, na realidade, o que falta
a cada personalidade, ela é, para cada indivíduo, aquilo que ele poderia
ter vivido e não viveu. ... Em geral, tomar consciência da sombra
provoca conflitos que põem em causa os hábitos, as crenças, os laços afetivos
e mais radicalmente os diversos espelhos da consciência de si. A experiência
do que foi reprimido ou daquilo que ainda nunca chegou ao consciente
desarticula o eu, faz com que perca seus pontos de apoio e mergulhe na
obscuridade.
Pela assimilação da sombra, o homem como que assume o seu
corpo, o que traz para o foco da consciência toda a sua esfera animal dos
instintos, bem como a psique primitiva ou arcaica, que assim não se deixam
mais reprimir por meio de ficções e ilusões." (Jung).
O processo de
assimilação da sombra promove a ascensão, a saída do rebanho, a libertação
dos condicionamentos, o início de uma experiência de vida independente e
livre, embora relativa - afinal o homem por mais independente que seja, é
escravo do ar que respira.
Ascender significa elevar-se, aglutinar as ilhas
da consciência fragmentada para chegar a percepção do todo.
Ao libertar-se
do rebanho o ser humano perceberá que ele é um universo, e é único. Tomar
consciência da sua individualidade é acentuar a percepção da sua diferença em
relação aos outros e emancipar-se das normas coletivas. As verdades – sempre
são subjetivas - dos grandes profetas, gurus, mestres iluminados e de
qualquer outro ser humano serão adaptados à sua natureza, à sua
individualidade, ao seu tempo e à sua realidade, porque toda verdade
é relativa. Enquanto as ovelhas são forçadas a se adaptar à doutrina dos
seus guias, o homem que se libertou saberá separar o acessório do principal,
as doutrinas de efeitos efêmeros das verdades fundamentais.
A Lei que move
o universo não pode ser ensinada porque a sabedoria resulta da vivencia direta. A função dos mestres é despertar as pessoas. As verdades dos grandes
mestres representam diretrizes. Elas servem como sinalizações, são setas nos
caminhos (Rohden) que cada um deve trilhar individualmente, superando
obstáculos e dificuldades porque os caminhos são pessoais, não há duas vidas
- duas vias - iguais. Assim como cada pessoa tem uma reação individual
perante os acontecimentos da vida, cada um tem uma forma de superar as suas
dificuldades. Determinado obstáculo pode ser superado com facilidade por uns
e ser uma barreira quase intransponível para outros. O mérito, portanto, não
reside na superação objetiva mas no esforço subjetivo.
Salvadores somente
existem na mente de pessoas inconscientes.
O homem que ascendeu está naquele
nível de que nos fala Platão:
"quem faz depender de si mesmo, se não tudo,
quase tudo o que contribui para a sua felicidade, e não se prende a outra
pessoa, nem se modifica de acordo com o bom ou mau êxito de sua conduta,
está, de fato, preparado para a vida; é sábio, na verdadeira acepção do
termo, corajoso e temperante."
Entretanto, consciente ou inconscientemente,
cada um tem a sua verdade, com a diferença de que o homem comum apega-se a
ela como uma coisa certa e definitiva e o sábio continua com a mente e o
coração abertos ao novo.
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